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30 janeiro 2010

Políticos profissionais

Não sei porque me lembrei deste texto.
Talvez porque hoje seja sábado.

(...) dificuldades económicas e (...) conflitos sociais; tanto no campo como na zona urbana, passa a existir uma população miserável mais interessada na procura do sustento quotidiano do que nos destinos da democracia.


Daí que o século IV se caracterize por demissão política do demos que perde interesse em participar na condução dos negócios da pólis - desinteresse que já começa a aparecer no decorrer da Guerra do Peloponeso. As sessões da Assembleia têm cada vez menos elementos e há dificuldade em perfazer o quórum. Ainda se tenta incentivar, como vimos, a participação com a distribuição de um salário aos presentes na Ecclesia - o misthos ecclesiasticos -, mas em grande resultado.

Se na primeira metade do século IV o demos ainda manifesta empenho, quando se tratava de decidir sobre uma guerra que a seus olhos possa ser frutuosa, na segunda metade já nem isso desperta o seu interesse. Essa apatia está bem visível na luta contra Filipe da Macedónia e nos apelos angustiados de Demóstenes.

A pólis grega caminhava para o fim.

Como resultado da demissão do demos, aparece com uma insistência cada vez maior a profissionalização e a especialização de funções.

Homens saídos da classe endinheirada - banqueiros, industriais, comerciantes - que não precisam dedicar-se a uma actividade manual e recebem consideráveis rendimentos dos seus negócios, tornam-se verdadeiros profissionais da «política». Com meios de fortuna, adquirem junto de «professores» de retórica a arte de falar e de convencer que lhes permite atrair a multidão e manobrar a Assembleia.

José Ribeiro Ferreira, A Democracia na Grécia Antiga, publicado pela Minerva, em Coimbra, em 1990. Pp. 161-162.

13 setembro 2009

Escolaridade obrigatória ao 12º ano: "uma boa dose de candura"

René Magritte
(imagem daqui)


Isto não é um comentário à decisão de aumentar a escolaridade obrigatória até aos 18 anos nem à afirmação de que "todos devem passar pela escola" (diferente de a escola deve passar todos, entenda-se).

Além do propósito de dar a toda a gente tanta educação quanto possível, posto que a educação, em si, é desejável, existem outros motivos que afectam a legislação educativa, os quais podem ser de elogiar, sem falar nos que, muito simplesmente, se limitam a reconhecer o inevitável e só mencionamos como lembrança da complexidade do sistema educativo. Um dos motivos, por exemplo, para elevar o limite de idade da escolaridade obrigatória é o louvável desejo de proteger o adolescente e de o fortalecer contra as mais degradantes influências a que se expõe ao entrar no mundo do trabalho. Esse motivo exige de nós uma boa dose de candura. Na verdade, em vez de afirmar que toda a gente beneficiará com mais anos de ensino, o que é duvidoso, devíamos confessar que as condições de vida na moderna sociedade industrial são tão lamentáveis e as restrições morais tão débeis que devemos prolongar a educação da juventude só por não termos a menor ideia do que fazer para a salvar. Em vez de nos felicitarmos pelo nosso progresso, sempre que a escola assume mais uma responsabilidade que até então pertencera aos pais, faríamos melhor se confessássemos que chegámos a uma fase da civilização na qual a família é irresponsável, ou incompetente, ou indefesa, e em que não podemos esperar que os pais formem os filhos adequadamente (...).

T.S. Eliot,
Notas para uma Definição de Cultura, Lisboa, Século XXI, 1996
.
Publicado pela primeira vez em 1948, confirmado pelo autor em 1961.

28 junho 2007

«Igualdade e desigualdade da participação dos cidadãos nas magistraturas»

O problema de retirar citações do contexto é sabido: perde-se o seu verdadeiro significado.
Andando às voltas com a leitura da Política (como se percebe), encontro tanta coisa que gostaria de aqui apresentar, mas ficava com postais enormes de, apenas, citações de Aristóteles.
As suas análises dos diferentes regimes políticos, as suas subdivisões, as vantagens e desvantagens de cada um... enfim, interessante, muito interessante. Fica um cheirinho:

O maior bem é o fim visado pela ciência suprema entre todas, e a mais suprema de todas as ciências é o saber político. E o bem, em política, é a justiça que consiste no interesse comum. A opinião geral é de que a justiça consiste numa certa igualdade (...). Mas uma questão que não pode ser ignorada é saber em que consiste a igualdade e a desigualdade. Isto levanta uma dificuldade e implica uma filosofia política.
(...)
entre tocadores de flauta igualmente hábeis na sua arte, não seriam, de preferência os bem nascidos a ser dotados de flautas, pois não é o mais bem nascido que toca melhor; a quem desempenhar melhor o seu trabalho, deve ser dado o melhor instrumento.
(...)
a superioridade de riqueza e o bom nascimento deveriam contribuir para o desempenho dessa função, mas o facto é que não contribuem.
(...)
Sendo esta comensurabilidade impossível [comparar bens, como estatura e virtude, por exemplo], é evidente que, em questões políticas, torna-se razoável que a aspiração às magistraturas não se funde numa desigualdade qualquer. (...) a pretensão de magistraturas deve fundar-se nos elementos que compõem a cidade. É com razão que os bem nascidos, os livres e os ricos disputam as honras. Os que ocupam uma magistratura devem ser necessariamente livres e pagar impostos (uma cidade, com efeito, nunca poderia ser composta apenas por pobres e escravos). Mas se a riqueza e nascimento livre são elementos necessários, é evidente que também o são a justiça e o valor guerreiro sem os quais não é possível o governo da cidade.
Sem os dois primeiros elementos é impossível a existência da cidade, e sem os dois últimos é impossível a boa administração.
1282b15-1283a20

27 junho 2007

Tabernices III - Provocações: regimes políticos e sociedade

(esqueci-me ontem de relembrar que foi dia de Taberna. Este é o postal ali publicado)

Gosto muito de ler os Antigos.
Porém, quando transcrevo passos dos clássicos, não está em causa a concordância com o que dizem, mas a minha constante admiração pelas questões que já então colocavam. Gosto das provocações que nos fazem, mas não os podemos encarar como regra nem lei!


Aqui vai uma provocação extraída da Política, de Aristóteles, em edição bilingue, traduzido por António Capelo Amaral e Carlos de Carvalho Gomes , editado pela Vega em 1998, com prefácio e revisão literária de R.M. Rosado Fernandes.

Deve-se primeiro definir o que constitui a disposição para a realeza, para a aristocracia, e para o regime constitucional.
Assim, destina-se a ser governado por um rei o povo que, por natureza, produz uma família que, graças à sua virtude, dirige os assuntos políticos.
Destina-se ao regime aristocrático o povo que produz naturalmente um corpo de cidadãos capazes de serem governados como homens livres por chefes aptos, graças à sua virtude, para dirigir os negócios da cidade.
O povo destinado ao regime constitucional é aquele em que existe um corpo de indivíduos com capacidade militar, e que podem governar e serem governados conforme a lei que reparte as magistraturas entre cidadãos abastados e segundo as suas virtudes.
1288a6-15
E a democracia? interroguei-me. Respondeu-me:

Aquando da primeira investigação sobre os regimes, sublinhámos que existiam três regimes rectos, a saber: realeza, aristocracia e regime constitucional, e que eram igualmente três os desvios em que podiam incorrer, a saber: a tirania como desvio da realeza, a oligarquia como perversão da aristocracia, e a democracia como perversão do regime constitucional.
1289a25-30
Bem, isto não se fica por aqui. Para a semana conto o que entendia Aristóteles por democracia. E, para desanuviar, aqui fica uma salada grega, a horiatiki: