30 julho 2009

VI Curso Livre de História do Algarve


Hoje, às 17.30, irei fazer uma palestra intitulada «O Algarve como recurso estilístico».
Sendo eu de literatura (sou licenciada em LLC - Estudos Clássicos e Portugueses), profissionalmente nunca explorei muito a literatura portuguesa (as minhas preferências e o meu tempo vão mais a grega e a latina), mas preparar esta apresentação deu-me muito prazer. Foi uma espécie de reencontro.

Espero que os presentes sintam um pouco desta alegria!

28 julho 2009

Ouvir o povo...

Não sei porquê, mas nas maiorias absolutas o Poder tem tendência a não ouvir o seu Povo. Essa atitude, mostra o saber dos Antigos, só traz desgraças a todos.

(...)

Hémon – Não é isso que afirma o povo unido de Tebas.

Creonte – E a cidade é que vai prescrever-me o que devo ordenar?

Hémon – Vês, falas como se fosses uma criança.

Creonte – É portanto a outro, e não a mim, que compete governar este país?

Hémon – Não há Estado algum que seja pertença de um só homem.

Creonte – Acaso não se deve entender que o Estado é de quem manda?

Hémon – Mandarias muito bem sozinho numa terra que fosse deserta.

(Sófocles, Antígona, vv. 733-739. Tradução de Maria Helena da Rocha Pereira)

26 julho 2009

De um amigo da Tamino...

(última foto da Tamino, de 25 de Junho)
... amor da sua dona.

IN MEMORIAM DA TAMINO

A Tamino era uma gata amável e terna, não fugindo de ser dura e corajosa quando entendia tal ser necessário. E isso acontecia, por exemplo, sempre que via o seu companheiro Mimi em dificuldades e a precisar de ajuda.

A sua doçura revelava-se, no entanto, quando subia ao colo; momentos esses em que sabia ser extraordinariamente leve e delicada... excepto quando se espreguiçava e as suas unhas se esticavam mais do que seria desejável...

Não se pense que, por ser leve, fosse mole. Nada disso! Na verdade, possuía uma agilidade notável, conseguindo atingir alturas nos seus saltos que deixavam toda a gente admirada. Para ela não havia lugares inatingíveis... nem que tivesse de pular dos ombros de alguém!

Amava a liberdade sem concessões e dificilmente a trocava por qualquer chamamento, mesmo que acompanhado por súplicas. A sua única fraqueza (e não são fraquezas inofensivas como esta que nos tornam mais humanos?) eram as latinhas de comida que a sua dona usava, batendo com um garfo, para a atrair. Mas, mesmo aí, quando suspeitava de ter sido enganada (só suspeita porque, naturalmente, a dona dava-lhe sempre a comida desejada), não perdia nem a sua imensa dignidade, nem a sua compostura plena de nobreza.

É que, para concluir, a Tamino sabia, com supremas inteligência e sensibilidade, ser gata e ser gatinha em toda e qualquer situação.

A sua partida é lamentada.

Não será esquecida.

25 julho 2009

Transmissão directa do Reboliço

(Obrigada, Ana!)

Do céu dos gatos (transmissão directa para a Xantipa)

- Olá. És a Carolina?
- Sou, sim. E tu és quem?
- Sou a Tamino. Cheguei há uns dias e não conheço ninguém. Lá em baixo disseram-me que talvez te encontrasse aqui. Posso ficar contigo?
- Acho que podes. Nunca tenho grande companhia.
- O que é que fazes para passar o tempo? Há ratos para perseguir?
- Não...
- Então este céu não é só para gatos?
- Não, Tamino: aqui é tudo igual a lá em baixo. Gente e bichos tudo misturado. E já assim às vezes é um tédio - imagina se não houvesse alguns seres diferentes de nós!
- Hum... então e o sol para nos estendermos a ele?
- Nada. Nem sol nem lua. É o infinito absoluto. Lembras-te quando lá em baixo ouvias as pessoas dizerem para não se pensar em nada?
- Lembro-me; fazia-me uma confusão...
- Olha, o nada é isto.
- Mas, e as latinhas de comida, quem é que as traz? E as bogas cozidas com as espinhas todas?
- Nada, Tamino. Daqui a algum tempo já nem te lembrarás disso. Agora ouço-te a dizer essas palavras e tenho uma ideia muito vaga de que já houve algum lugar onde faziam sentido.
- É muito estranho. E não dá medo?
- Estás a sentir medo?
- Não. Estou descansada. E desapareceram-me as dores.
- Ora bem; deixa-te estar. Podes ficar aqui ao meu lado. E, se quiseres, depois iremos saltar nuvens. Isso é que é!...

23 julho 2009

Requiescat In Pace





O Mimi vai sentir a falta dela.
E eu também.
Estou contente por não ter mudado a foto do blogue. A minha amiga Ângela disse-me que eu ficava assim muito bem, com a Tamino colo.
Mas meu cabelo já não é aquele, está curto e sem pintura, e a Tamino já não está entre nós.
Este é mesmo um espaço virtual.

22 julho 2009

A gata Tamino...


... tem este nome porque eu pensava que era um gato. Como a Flauta Mágica era a minha ópera preferida, escolhi o nome do príncipe para o meu primeiro animal de estimação. Nunca tinha tido um gato, e, naquele Novembro de 1998, fiquei muito atrapalhada quando vi a Tamino sem movimento durante horas. A minha amiga Susana sossegou-me, dizendo que ela estava apenas a... dormir!
A Tamino está muito doente. Contrariamente ao Mimi, que teve uma lipidose hepática grave, algo curável, ela tem uma insuficiência renal crónica. Os níveis de ureia que, para a idade dela, deveriam estar entre 16 e 36, estão acima de 130, que a máquina não lia mais... A creatinina, que devia estar entre 0,8 e 2,4 está a 5,7...
Estou muito, muito triste.

Só vim aqui dizer isto.

17 julho 2009

«Os tiranos não são loucos: enlouquecem»


Alçada Baptista em Tia Suzana, Meu Amor, sobre Kleist:


«Mas a tia Suzana achava que o poeta era louco:

- A gente tem de viver dentro de certas regras não só para poder estar com os outros mas, sobretudo, para manter o nosso tino. Quando cada um se julga capaz de fazer as suas próprias leis, enlouquece. Por isso é que é muito mau dar a um homem o poder de ditar todas as leis. Os tiranos não são loucos: enlouquecem.»

16 julho 2009

Sangue- Estudos de Antígona

(foto enviada pelo meu amigo Rui Viola)

Talvez por ter tido o privilégio de conhecer o grupo e o projecto ainda em embrião, achei que tinham chegado a um excelente resultado.

A verdade é que gosto muito de ver os textos antigos, ou melhor, as ideias dos textos antigos a reviverem através de novas palavras, actualizadas nas novas realidades. A peça tem diversos registos que coexistem, nem sempre pacificamente: um vídeo projecta, constantemente, imagens que nos desafiam a procurar a ligação que têm ao texto que ouvimos na representação dos actores, esse mesmo texto que está legendado a um canto do ecrã. Por vezes, é nesse pano de fundo que surgem as palavras que não são pronunciadas, mas representadas pelos actores. Um espectáculo que se poderia dizer multimédia sem qualquer depreciação.

Os três actores representam todas as personagens. Isto poderá não parecer nada de especial, visto que já Aristóteles nos disse que «Ésquilo foi o primeiro que elevou de um a dois o número de actores (...). Sófocles introduziu três actores»(Poética 1449a18). Se repararmos bem, para além do Coro e do seu Corifeu, em cena nunca temos mais de três actores. Na Antígona, temos cenas com dois actores (Antígona e Ismena ou Creonte e Hémon) e outras com três (Antígona, Ismena e Creonte ou Creonte, Antígona e Guarda).
Então, qual a diferença?
Aqui, Sara Ribeiro faz, ao mesmo tempo, de Antígona e Ismena e João Pedro Santos faz de Creonte e Hémon. A princípio podia-se pensar que as legendas serviriam para ajudar a perceber quem era quem, mas a encenação e a representação estão de tal modo bem feitas que se vê lindamente a mudança de personagem.
A Isa Araújo é uma presença constante: guarda, corifeu, guia de Tirésias... com uma voz bem modulada e articulada, muda de registo nos diferentes papéis, bastante expressiva na sua (e de João Garcia Miguel)
interpretação da ode ao homem.

Faz parte da própria natureza deste tipo de espectáculo, em que um texto antigo é recriado e lido de outra forma, em diferentes suportes, não ser fiel ao texto. Mas nem é disso que se trata.
Alunos de teatro, mas já actores extraordinários!
Gostei muito deste Sangue-Estudos de Antígona, que gostaria de voltar a ver.
Dêem-me a vossa opinião!

15 julho 2009

Férias?

«A senhora sócrates» não está de férias e pede desculpa aos leitores pela ausência.
O trabalho e o cansaço são grandes, deixando-me pouco tempo para vir até aqui.
Agradeço as palavras simpáticas dos amigos que me estimularam a voltar a postar.

04 julho 2009

Maria Helena da Rocha Pereira - Medalha de Ouro da cidade de Coimbra

Fui chamada à atenção para este evento por um gentil leitor deste blogue.
A Professora Doutora Maria Helena da Rocha Pereira personificou, durante muito tempo, as letras clássicas portuguesas, sendo acidental o ser de Coimbra. Poucos vultos serão tão conhecidos fora do «nosso mundo dos clássicos» como ela. Antes de ir para a faculdade, ainda no ensino secundário, só ainda tinha ouvido falar de dois nomes: Rebelo Gonçalves (autor do Vocabulário de Língua Portuguesa que ainda hoje consulto) e M.H. Rocha Pereira, de quem li os Estudos de História da Cultura Clássica (de capa castanha e não rosa, como as últimas edições), livros fundamentais para a compreensão do mundo antigo. Estão muito sublinhadinhos (a lápis, a lápis) e anotados, naquele papel que a Gulbenkian usa, grosso e brilhante.
Não fui sua aluna, mas todos os que o foram dizem ter sido uma experiência inesquecível.
Cruzei-me com ela algumas vezes e, quando organizei um colóquio e a convidei, recebi uma carta sua a lamentar não poder estar presente e a desejar que corresse bem (gesto delicado e simpático que não tiveram outros catedráticos que também convidara).
Desbravou caminhos, abriu um espaço para os estudos clássicos, publicou nas mais exigentes e prestigiadas editoras estrangeiras (como a alemã Teubner).
Merecedora, sem dúvida, de muitas medalhas de ouro.

02 julho 2009

Sabedoria de Jaime Bunda... agente secreto

A personagem Jaime Bunda, criada por Pepetela, com uma lógica muito própria, mistura saberes (ou falta deles) e citações. Reparem nesta delícia (p. 25, da 8ª edição, nas Publicações Dom Quixote):

Mas nunca ouviu dizer que dura lex sede lex, quer dizer, a lei dura muito e tem sede de lei? Frase de Aristóteles.