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«-Atenção, Eutidemo!» - continuou Ctesipo. «'Não estás a atar um fio ao fio' refere o provérbio. É que estás a dizer coisas estranhas, se o teu pai é pai de todos.»
«-Mas é» - afirmou.
«-Apenas dos homens?» - perguntou Ctesipo - «Ou também dos cavalos e de todos os outros animais?»
298 d «-De todos» - respondeu.
«-E será que a mãe também é mãe?»
«-A mãe também.»
«-Por conseguinte, a tua mãe é também mãe dos ouriços do mar.»
«-E também a tua» - disse.
«-E tu, portanto, és irmão dos vitelinhos, dos cãezinhos e dos leitõezinhos.»
«-Sim, e tu também» - disse.
«-Então tens um pai cão.»
«-E tu também.»
«-Em breve irás concordar com isto, Ctesipo, se me responderes» - disse Dionisodoro. - «Diz-me pois: tens um cão?»
«-E muito feroz» -respondeu Ctesipo.
298 e «-E sem dúvida tem cachorrinhos?»
«-Que também são outros que tais.»
«-Portanto, o cão é pai deles?»
«-De certeza. Eu próprio o vi a cobrir a cadela.»
«-Ai sim? E o cão não é teu?»
«-Absolutamente.»
«-Então, ele é teu, sendo pai, de modo que o cão passa a ser teu pai e tu irmão dos cachorrinhos?»
E de novo Dionisodoro tomou rapidamente a palavra, para que Ctesipo não dissesse alguma coisa primeiro:
«-Dá-me ainda mais uma pequena resposta: bates nesse cão?»
Ctesipo riu-se e disse:
«-Sim, pelos deuses! Já que não posso bater em ti.»
«-Então bates no teu próprio pai?»
Platão, Eutidemo, Lisboa, INCM, 1999
4 comentários:
Nos meus tempos de copos aturei no Bairro Alto conversas de bebado muito parecidas...
Já somos dois
Só para dizer que passei por aqui e me voltei a surpreender com tudo o que tu arranjas tempo para fazer. Agora até um blog! Que inveja!!
J. J.
Aparentemente tolo este trecho do diálogo 'Eutidemo' mostra o lado cômico e enrevesado dos raciocínios sofisticos
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