07 dezembro 2007

Kalevala - tradução do original

Um cheirinho da tradução, directamente do finlandês, por Merja Mattos-Parreira e Ana Isabel Soares, roubada com grande descaramento do blogue desta última.

(Ouvi dizer que saíu uma edição de Kavela traduzida de outras línguas que não a original. Obviamente que me recuso a ler uma tradução de uma tradução, havendo esta praticamente no prelo. E não entendo como a embaixada da Finlândia pôde estar presente nesse lançamento.)

Depois de dizer muitas vezes "Obrigado, senhor Lönnrot, obrigado!", o Reboliço desabafa: era um grande mal agradecido, esse Lönnrot, é o que era! Quantas vezes os heróis trabalham, labutam, lutam, laboram, conseguem os feitos, só para o romântico médico lhes rematar as falas com um "Louve-se Deus." Nestes versos, o herói maior, Väinämöinen, ferido com um machado no joelho, contorce-se com dores e recebe, finalmente, a ajuda de um velho deitado ao lume:

"O velho expulsou a dor,
o sofrimento empurrou
para o meio de Kipumäki,
para o pico de Kipuvuori,
para dar a dor às pedras,
entregar à rocha a dor."
(Canto IX, vv. 523-528)

Pois não querem lá ver a resposta do herói, depois de o sangue estancar?

"Bendito sejas, ó Deus,
bendito, Criador único,
que a mim tanto ajudaste,
me trouxeste protecção
a mim nestas grandes dores,
do férreo aço a ferir!”
(Canto IX, vv. 571-576)

Assim, não dá!...

(Elias Lönnrot foi o médico que, entre 1833 e 1853, viajou pela Carélia e reuniu cantos, rezas e lengalengas populares, que haveria de publicar como cancioneiros e como a epopeia Kalevala. Nesta, compôs uma história a partir de várias camadas de histórias, passadas oralmente, de geração em geração. Um dos debates literários mais prolixos ainda hoje na Finlândia prende-se com saber em que medida o compilador foi ou não autor dos versos, isto é, terá interferido na construção das narrativas, nomeadamente no que a atitudes religiosas diz respeito. Um dado é certo: há muitos momentos de incongruências narrativas, e os versos acima dão conta de uma apenas.)

4 comentários:

Rui Oliveira disse...

Curioso, hoje, na FNAC vi o livro e peguei nele e comecei a ler a introdução e, realmente, não queria acreditar quando vi que a tradução não era directa. Sinceramente, sou tradutor, embora de línguas pouco exóticas, e penso que, actualmente, não qualquer justificação para se fazer uma tradução indirecta, ainda por cima de um país como a Finlândia.

Rafeiro Perfumado disse...

Eu nunca confiaria num gaijo que fala de Kipumäki...

Pacanherros disse...

Éh pá, isto agora parece que tá mais bonito... com uma imagem de título nova e tal... são enfeites de natal ou apenas estratégias de marketing?

Sinceramente, quando vi o nome da tradutora, a minha dislexia levou-me a ler "Mejera". Não seria esse o nome a dar à sua tradção??


Vamos lá professora, deixe comentários no Arranhí Pacanherra, ou "Arranhí Pacarreta", ou "Arranhí Pacarrenha". A gente dá-lhe liberdade de escolha pra nos chamar o que quiser, inclusíve palavrões se a qualidade dos textos assim o merecer!

Cumprimentos.

Reboliço disse...

Estás sempre à vontade, Xantipa. Mi molino es tu molino ;)