Portanto, se entre os bens do corpo encontramos alguns de que o ser humano pode não usar com rectidão, nem por isso dizemos que eles não lhe deviam ter sido dados, pois reconhecemos que são bens (...).
De facto, quando um corpo não tem mãos, vês que lhe falta um bem importante. Contudo, faz um mau uso das mãos quem as emprega em acções violentas ou vergonhosas. (...)
Portanto, assim como aprovas estas coisas em realção ao corpo e, sem reparar naqueles que fazem mau uso delas, louvas Aquele que deu estes bens, também confessarás que a livre vontade, sem a qual ninguém pode viver com rectidão, é necessariamente um bem e um dom divino, e que mais se deve condenar aqueles que usam mal deste bem, do que afirmar que não no-lo deveria ter dado Aquele que no-lo deu.
Santo Agostinho, Diálogo Sobre o Livre Arbítrio, INCM, Lisboa, 2001. Tradução de Paula Oliveira e Silva.
4 comentários:
Não sou católico. De todos os escritos de Pais da Igreja, os de Santo Agostinho foram sempre os que mais me comoveram. São Tomás de Aquino não me impressiona.
Olá, Xantipa.
O libertismo de Agostinho de Hipona era apologético. Visto a esta distância não parece sequer polémico. Mas hoje há muito quem, com Espinoza, clame contra esse libertismo que pretende promover o homem à custa de um hipotético livre arbítrio. Desse ou do de Sartre, por exemplo. É que dos lados das ciências ditas «de ponta» vão vindo argumentos cada vez mais fortes a favor do determinismo radical. E assim se pode 'reformar' Agostinho....e abrir outras portas para compreender o homem e o mundo que não as da apologia. Mas tudo ficou menos «preto e branco»...o que é sempre estimulante.
Cumprimentos!!
Dominicanos, Inquisição... nunca me enganaram...antes Franciscano labrego do que Dominicano Doutor...
Caro Funes,
Já fui católica e, nessa altura, não lia os padres da Igreja. Agora deu-me para isso...
:)
Caro Goldluc,
Gosto de acreditar no livre arbítrio, por mais teses deterministas que surjam.
:)
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