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20 setembro 2009

Pelo que diz Sócrates, somos todos sensatos...

Ora o maior dos castigos é ser governado por quem é pior do que nós, se não quisermos governar nós mesmos.
É com receio disto, me parece, que os bons ocupam as magistraturas, quando governam; e então vão para o poder, não como quem vai tomar conta de qualquer benefício, nem para com ele gozar, mas como quem vai para uma necessidade, sem ter pessoas melhores do que eles, nem mesmo iguais, para quem possam relegá-lo.
Efectivamente, arriscar-nos-íamos, se houvesse um Estado de homens de bem, a que houvesse competições para não governar, como agora as há para alcançar o poder, e tornar-se-ia então evidente que o verdadeiro chefe não nasceu para velar pela sua conveniência, mas pela dos seus súbditos. De tal maneira que todo aquele que fosse sensato preferiria receber benefícios de outrem a ter o trabalho de ajudar ele os outros.


Platão, República 347c-d.
Sempre esta tradução.

13 julho 2008

ser corajoso

É claro, ó Laques, que eu não vou chamar corajoso nem a um animal nem a qualquer outro ser que, por falta de entendimento, não receie aquilo que é perigoso. Chamo-lhe temerário e louco. Ou também julgas que chamo corajoso às crianças em geral, as quais, por falta de entendimento, nada temem? Pois, para mim, temerário e corajoso não são a mesma coisa. Segundo penso, muito poucos possuem a coragem e a previdência. O arrojo, porém, a audácia e a temeridade, a par da imprevidência, são partilhadas por muitíssimos homens, mulheres, crianças e animais. A esses, pois, que tu e a maioria chamam corajosos, eu chamo arrojados, e chamo corajosos aos dotados de senso.

Diz o general Nícias no diálogo Laques (197a-b), em tradução de Francisco de Oliveira. A minha edição é no INIC,1987, mas há uma reedição nas Edições 70, de 2007.

10 maio 2008

«Transforma-se o amador na cousa amada»

Se Hefesto, o deus da forja, perguntasse aos amantes:
«Não será a isto que vocês aspiram - a identificarem-se o mais possível um ao outro, de forma a não mais se separarem noite e dia? Se é essa a vossa aspiração, estou disposto a fundir-vos e soldar-vos numa só peça, de tal modo que em vez de dois, passem a ser um só. E assim vos será dado ter uma única vida enquanto viverem, como se fossem uma só pessoa; e como uma só pessoa hão-de continuar lá no Hades, depois de morrerem, levados por uma única morte.»
Este seria o desejo dos amantes, porque
«a nossa primitiva natureza assim era e nós constituíamos então um todo. Ora, é essa aspiração ao todo, essa busca incessante, que tem o nome de amor.»

Platão, Banquete, 192e-193a. Tradução de Teresa Schiappa de Azevedo para as Edições 70. Outros excertos neste blogue em vários sítios, como aqui, aqui , aqui ou aqui.

12 novembro 2007

Do amor

(Foto minha. Rodin - Eros e Psyche - Ermitage - S. Petersburgo)

O amor não tem uma natureza simples, bela ou feia em si mesma: é belo, se realizado com beleza, e feio, se realizado com vileza.
Vileza é quando se concede uma afeição indigna a um homem indigno; e nobreza, quando se concede uma feição digna a um homem de bem. E por indigno entendemos justamente esse amante popular, que prefere o amor do corpo ao amor da alma, e não guarda constância porque o objecto a que se prende não é também constante [...].
Pelo contrário, aquele que ama alguém pela beleza do seu carácter, esse permanece fiel pela vida fora, porque se funde com o que é constante.

Discurso de Pausânias no Banquete de Platão. Tradução de Maria Teresa Schiappa de Azevedo para as Edições 70.

Para mais discursos do Banquete, ver aqui, aqui, aqui...

21 outubro 2007

filósofo... ministro?

«a raça humana não cessará os seus males antes que a raça daquele que ama o saber correctamente e com verdade chegue ao poder governativo ou que aqueles que têm o poder nas cidades, através de uma intervenção divina, se dediquem realmente à filosofia.»

( Platão, Carta VII, 326b. Tradução minha)

23 junho 2007

Educação (Platão)

- Que queres dizer?
- Que quem é livre não deve aprender ciência alguma como uma escravatura. E que os esforços físicos, praticados à força, não causam mal algum ao corpo, ao passo que na alma não permanece nada que tenha entrado pela violência.


República, 536e

19 junho 2007

ginástica e alma - Platão

- Então, que educação há-de ser? Será difícil achar uma que seja melhor do que a encontrada ao longo de anos - a ginástica para o corpo e a música para a alma?
- Será, efectivamente.

(República*, 376e. E depois de umas refutações, em 527b)

(...) a geometria é o conhecimento do que existe sempre.
-Portanto, meu caro, serviria para atrair a alma para a verdade e produzir o pensamento filosófico, que leva a começar a voltar o espírito para as alturas e não cá para baixo, como fazemos agora, sem dever.

*tradução de M.H. Rocha Pereira, para a Gulbenkian.

26 fevereiro 2007

Da lógica da batata...

Platão, Eutidemo, 300a:
«Os homens vêem primeiro as coisas que podem ver ou as que não podem ?»
«As que podem»


Mesmo que o jovem Ctesipo tivesse dito as que não podem, seria refutado...
O sofisma que se segue baseia-se numa ambiguidade sintáctica (anfibologia) permitida pela frase acima:

  • sentido passivo (e imediatamente apreendido por qualquer um de nós) - Os homens vêem primeiro as coisas que [eles, homens,] podem ver - isto é, as coisas que podem ser vistas (pelos homens).
  • sentido activo - Os homens vêem primeiro as coisas que podem ver - isto é, as coisas que têm a capacidade de ver - isto é, as coisas com olhos.
Então, Eutidemo pergunta que coisas podem os mantos estar também a ver... já que Ctesipo pode ver os mantos...

01 janeiro 2007

Homossexualidade - Banquete (7)

(continuação)
Por outro lado, todas as mulheres do corte de um ser feminino não ligam praticamente aos homens e voltam-se de preferência para as mulheres: e aí estão as «comadrinhas» a ilustrar a descendência do género... Finalmente, todos os que resultam do corte de um ser masculino só andam atrás de homens, e mesmo de pequenos, como pequenas postas que são de um ser viril, revelam o seu fraco por homens e comprazem-se em estarem deitados a seu lado, abraçados a eles...
(191e)

22 dezembro 2006

«Oh, metade amputada de mim!» - Banquete (3)

(continuação)
(receando a força e ambição destes seres, Zeus decide)

«Parece-me», anunciou, «que arranjei processo de continuar a haver homens e acabar de vez com a sua arrogância: é enfraquecê-los. Agora mesmo vou dividi-los ao meio um por um; deste modo, não só hão-de ficar mais fracos como também sairemos beneficiados, graças ao aumento de número. Por enquanto, podem caminhar erectos sobre as suas duas pernas; porém se virmos que mesmo assim persistem na arrogância e se recusarem a dar-nos tréguas, então», declarou, «volto a dividi-los ao meio e passam a andar só sobre uma perna… ao pé-coxinho!»
Dito e feito. Pôs-se a cortar os homens às metades, exactamente como se cortam sorvas para as pôr em conserva [ou como se faz aos ovos com um cabelo]. À medida que os ia cortando, encarregava Apolo de lhes virar o rosto e a metade do pescoço para a superfície amputada, na ideia de que os homens se tornariam mais humildes com o espectáculo da sua própria amputação diante dos olhos.

Platão, Banquete, 190c-e. Edições 70, 1991. Tradução, introdução e notas de Teresa Schiappa de Azevedo.
Oiça «Pedaço de mim» - Chico Buarque e Zizi Possi

20 dezembro 2006

Sol, Terra e Lua - Banquete (2)

Quanto à origem destes três géneros, com tais características, ei-la: o macho foi inicialmente um rebento do Sol; a fêmea, da Terra; e da Lua, a espécie que reunia as características dos dois, dado que também a Lua partilha da natureza do Sol e da Terra. Daí o facto de serem globulares, tanto eles como a sua marcha – devido à semelhança com os seus progenitores.

Platão, Banquete, 189e-190a. Edições 70, 1991. Tradução, introdução e notas de Teresa Schiappa de Azevedo.

14 dezembro 2006

Os três géneros - Banquete (1)

(O Banquete para ser ouvido em inglês...)

Diz Aristófanes, no discurso que faz sobre o Amor, no Banquete, de Platão:

Para começar, a nossa antiga natureza não era tal como hoje e sim diversa. Para começar, os seres humanos encontravam-se repartidos em três géneros e não apenas em dois – macho e fêmea – como agora: além destes, havia um terceiro que partilhava das características de ambos, género hoje desaparecido, mas de que conservamos ainda o nome. Era ele o andrógino, que constituía então um género distinto, embora reunisse, tanto na forma como no nome, as características do macho e da fêmea; hoje, contudo, não passa de um nome lançado ao descrédito…

Em segundo lugar, a forma de cada ser humano era inteira e globular, com as costas e os flancos arredondados. Tinham quatro mãos e igual número de pernas; sobre o pescoço redondo, duas faces, iguaizinhas uma à outra; uma única cabeça onde assentavam as faces, colocadas em sentido oposto; quatro orelhas; órgãos genitais em número de dois; e tudo o mais que a partir daqui possa imaginar-se. Caminhavam erectos, como agora, mas nos dois sentidos em que o desejassem. Porém, quando os assaltava o desejo de correr a toda a brida, faziam-no às cambalhotas, projectando as pernas para o ar, como os equilibristas, até regressarem à posição vertical. E assim, apoiados nos seus membros, que eram oito, se deslocavam velozmente em círculo.

Platão, Banquete, 189e-190a. Edições 70, 1991. Tradução, introdução e notas de Teresa Schiappa de Azevedo.